Sociólogo - Escritor

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"La Casa de la Magdalena" (1977), "Essays of Resistance" (1991), "El destino de Norte América", de José Carlos Mariátegui. En narrativa ha escrito la novela "Secreto de desamor", Rentería Editores, Lima 2007, "Mufida, La angolesa", Altazor Editores, Lima, 2011; "Mujeres malas Mujeres buenas", (2013) vicio perfecto vicio perpetuo, poesía. Algunos ensayos, notas periodísticas y cuentos del autor aparecen en diversos medios virtuales.
Jorge Aliaga es peruano-escocés y vive entre el Perú y Escocia.
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19 de junio de 2010

Seminário Caio Prado Júnior e José Carlos Mariátegui



Seminário Caio Prado Júnior e José Carlos Mariátegui
Com a organização dos professores Milton Pinheiro e Sofia Manzano, realizou-se na Universidad Nacional Mayor de San Marcos o Seminário Caio Prado Júnior e José Carlos Mariátegui: duas visões do socialismo latino-americano, nos dias 3 e 4 de junho do corrente ano.

O evento foi inaugurado e encerrado pelo Presidente do Instituto Cultural José Carlos Mariátegui, Renán Raffo.

O objetivo do Seminário foi vincular os pensamentos destes dois grandes pensadores do socialismo latino-americano e fazer uma releitura de suas respectivas obras, pautada na realidade atual.

Milton Pinheiro apresentou a influência do trabalho de Mariátegui no Brasil; Héctor Béjar recordou o debate ideológico do marxismo contemporâneo de Mariátegui; Sofia Manzano fez uma exposição da obra de Caio Prado Júnior; Roberto de la Cruz expôs as grandes linhas do pensamento de Amauta; Sara Beatriz Guardia analisou a obra de Mariátegui numa perspectiva de gênero; Rafael Ojeda comparou o pensamento de Mariátegui com o debate filosófico de hoje; José Ignácio López Soria debateu os atuais desafios da diversidade, multiculturalidade e interculturalidade.

Comentaram alguns trabalhos Osmar González, Jorge Aliaga, Alfonso López Chau e Pilar Roca.

O evento foi assistido por Sandro Mariátegui, filho de Amauta, e contou com a participação, no ato de abertura do seminário, do Coro da Federação de Trabalhadores da Construção Civil.

O seminário teve início com um debate teórico atualizado, que pôs o pensamento de Mariátegui no centro dos esforços pela unificação da esquerda peruana. A versão brasileira do evento será realizada entre os dias 15 e 17 de junho, nas Universidades do Rio e Campinas (São Paulo).

Por Jorge Aliaga Cacho

Valorizar a substancial obra de Caio Prado Júnior é vital para delinear o desenvolvimento da história das ideias na América Latina. Caio Prado Júnior, no Brasil e José Carlos Mariátegui, no Peru, ponderaram a teoria marxista para logo aplicá-la na interpretação da realidade sócio-econômica, cultural e política de seus respectivos países. O pensador paulista analisou a problemática social brasileira e as estratégias para a mudança social no Brasil. Estudou a relação existente entre pobres, agricultores rurais e a atividade política geral no contexto de uma ordem pós-colonial, que foi tipificada em “Agrária não camponesa”, como uma ordem “sem feudalismo, sem capitalismo clássico e sem uma burguesia nacional”. (Raimundo Santos: Rio de Janeiro: Mauad: 2001).

Caio Prado Júnior atribuiu à exógena economia brasileira qualidades próprias de um círculo vicioso, que atuou em detrimento do interesse doméstico do país e que levou o Brasil a um desigual crescimento, cujo desenvolvimento dependente pôs em perigo a própria sustentabilidade da nação. Este círculo vicioso, argumentou Prado Júnior, tornou difícil a transição do Brasil, de uma economia colonial a uma economia nacional, e excluiu a classe trabalhadora tanto da distribuição da riqueza como também da participação nos processos políticos emergentes. Este último, estabeleceu Prado Júnior, trouxe como resultado paupérrimas condições de vida e violenta repressão para as classes populares. Estes fatos demonstram que o colonialismo não foi derrotado no processo de independência brasileira, mas sim reafirmado durante o processo da república. À algo análogo chegaria o pensamento de Mariátegui, quando escrevera em seus “7 ensayos de interpretación de la realidad peruana”:

“A aristocracia terratenente, defendendo seus privilégios de princípio, conservava suas posições e, de fato, seguia sendo, no Peru, a classe dominante. A revolução não havia realmente elevado ao pode uma nova classe. A burguesia profissional e comerciante era muito débil para governar. A abolição da escravidão não passava, por isso, de ser uma declaração teórica. Porque a revolução não havia tocado o latifúndio”. (“7 ensayos”, p. 69. La revolución de la independencia e la propiedad agraria”).

Mariátegui também escreveu:

“A economia do Peru é uma economia colonial. Seu movimento, seu desenvolvimento, estão subordinados aos interesses e às necessidades dos mercados de Londres e de Nova York. Estes mercados enxergam no Peru um depósito de matérias-primas e uma praça para suas manufaturas”. (“7 ensayos”, p. 98, “Colonialismo” de nuestra agricultura costeña).

A partir do ponto de vista historiográfico, Caio Prado Júnior apontava que a dificuldade central do Brasil era o problema da escassez de mão de obra e o problema da sujeição à propriedade. Prado Júnior sugeriu como solução para este problema a eliminação das velhas relações patrimoniais, sobreviventes do regime escravista e a regulação dos direitos dos trabalhadores do campo. Em resumo, Prado Júnior, defendia a modernização dos sistemas laborais.

Na historiografia brasileira se encontra evidência de que os colonizadores portugueses encontraram no Brasil organizações sociais, supostamente, de menor desenvolvimento. Também encontraram carência de mão de obra, em contraste com a abundante disponibilidade de terras. Por estas razões, os lusitanos viram a necessidade da escravização, a mesma que chegou, posteriormente, nas regiões indo-hispânicas.

No Peru, diferentemente do Brasil, os colonizadores espanhóis encontraram sociedades indígenas que possuíam sistemas de trabalho coletivo, disciplina. Eram hierárquicas em sua organização, sedentárias e possuíam grupos sociais legalmente diferenciados.

Os problemas de caráter racial e econômico do Brasil, sustentava Caio Prado, eram consequência do colonialismo dirigido pelo comércio europeu global. Esta explicação desafiou as teorias de seus contemporâneos, como Gilberto Freyre, que celebrava o caráter híbrido da cultura brasileira, graças aos combinados efeitos da mestiçagem, um clima tropical e a relativa 'benígna' forma de escravização.

Raimundo Santos, estudioso da obra de Prado Júnior, sugere que o pensamento marxista do século XX no Brasil, se manteve em constante debate com teorias de história, sociologia e antropologia, tomando como referência o caráter e a história nacional, assim como também, a luta organizada no Brasil. A obra de Caio Prado, podemos afirmar categoricamente, vem servindo de grande influência no devir histórico brasileiro.

Santos também propõe que a adaptação de Caio Prado à teoria clássica marxista serviu como um constante referencial no complexo desenvolvimento do Partido Comunista no Brasil e defende que é impossível compreender o pensamento sócio-político e a prática do século XX, no Brasil, sem examinar a cultura política do comunismo brasileiro. (Raimundo Santos: Rio de Janeiro: Mauad: 2001).

Guillermo Palacios y Olivares, num artigo publicado na Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, compara a temática da obra de Caio Prado Júnior com a temática da experiência agrária mexicana, particularmente, nas décadas de 1930-1940. Neste trabalho, Palacios distingue claramente algumas ideias caio-pradianas sobre a integração nacional e o tratamento diferenciado dos problemas da cultura no âmbito rural e, em especial, o da questão campesina.

“Para Caio Prado, e todos sabemos disso, a situação agrária brasileira durante os anos 1930 do século passado está caracterizada pela persistência do latifúndio e pelo contínuo predomínio das relações patrimoniais no campo, apesar de algumas evidências de um incipiente (e não sustentável) processo de fragmentação fundiária, resultado da crise do setor exportador durante a primeira metade da década. É um panorama que se mantém na perspectiva de nosso autor até os anos em que escreve os seus artigos sobre a questão agrária no Brasil, com equilíbrios e mudanças sim, porém nenhuma suficientemente importante para modificar as bases do modelo. Contra esse pano de fundo aparece o problema da “integração nacional”, porém, repito, referente ao núcleo que Caio Prado havia definido como o constitutivo da dinâmica histórica do Brasil: as relações de trabalho.

Em sua perspectiva, o problema da “integração nacional” tem a ver, basicamente, com a existência de numerosas variantes contratuais que persistem no interior das relações patrimoniais de trabalho no campo e que impedem, entre outras coisas, a formação de um contingente uniforme de força de trabalho, capaz de postular reivindicações comuns, e de incorporar as características de um exército de trabalho moderno à cidadania plena. É uma percepção da “integração nacional” como algo que tem a ver, basicamente, com a modernização do mercado de mão de obra, de maneira a que todos os trabalhadores se integrem nacionalmente, sob um mesmo padrão e constituam, de novo, uma força de trabalho homogênea, sujeita aos mesmos direitos e habilitada para formular demandas uniformes, de classe”.

Esta é uma perspectiva que suprime qualquer outro problema no caminho da integração nacional, e vê a integração como consequência da introdução e extensão dos direitos do trabalhador moderno, tais como, direito de greve, direito à educação e saúde, descansos remunerados, remunerações dignas, etc. Caio Prado Júnior não chegou a propôr uma reforma agrária geral, pelo menos antes de 1960, porém as Ligas Camponesas, associadas ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), defenderam essa opção.

Guillermo Palacios y Olivares nos propõe a seguinte pergunta: Por quê o “problema da cultura” não é um problema para Caio Prado (ou não está relacionado com a questão da “integração nacional”)?

Palacios y Olivares, acadêmico mexicano, opina que a “cultura” não existe no campo da reflexão de Caio Prado Júnior como podem ver os historiadores “culturalistas” de nossos dias. O asteca defende que a “cultura” não existe em dois sentidos: o primeiro, de caráter historiográfico, que se prende na percepção que se teria na época das obras historiográficas de Caio Prado Júnior: “a escravidão como um sistema que não permitia outras perguntas que não fossem as ligadas à esfera da exploração do trabalho, a circulação comercial e à acumulação do capital. Estudar questões “culturais” no âmbito da escravidão era dedicar-se a ilusões vazias, que diminuíam até desaparecer completamente ante a magnitude da verdadeira dimensão que a dava sentido”.

O segundo era a concepção que o marxismo pré-gramsciano teria dessa dimensão da vida, o­nde a cultura se percebia como um resultado da ideologia. Eliminado o tema da “cultura”, na opinião de Palacios y Olivares, como algo que valeria a pena ser estudado pela história, “havia preparado uniformemente o mercado de trabalho durante a Colônia e na primeira metade do século XIX. Depois, no processo de sua desintegração, havia se desintegrado também essa unidade em uma gama de variantes relações laborais que “desintegraram” por sua vez a nação”. Esta foi a razão pela qual a reunificação dos modelos contratuais no campo fosse condição fundamental para a “re-integração” do Brasil.

Para finalizar, é necessário precisar que qualquer análise que trate sobre a obra de Caio Prado Júnior deve captar as diversas posições do autor e suas relações com o Marxismo. Prado Júnior foi o primeiro autor brasileiro a aplicar a ciência Marxista de maneira correta e diferenciada para analisar a história de seu país. Desta maneira, nos deixa o entendimento dos mais substanciais fenômenos da formação histórica do Brasil, que são de vital importância para compreender a realidade nacional e prescrever a estratégia de mudança que seu povo demanda.





Por: Héctor Béjar

Todas as pessoas, tanto as comuns como as singulares, a que chamamos de personalidades, tem várias imagens, várias representações e sua obra dá lugar à múltiplas interpretações, às vezes, equívocas com o passar do tempo. A imagem de José Carlos Mariátegui que cultivamos é também multifacetada. Podemos evocar o Mariátegui jornalista que ganha a vida com seus artigos, o ativista político organizador do Partido Socialista e depois Comunista, o pai de família com filhos numerosos, o amante e o devoto esposo, o empresário de Minerva e editor de Amauta, o revolucionário, o teórico do Peru, o novelista e crítico literário. Uma personalidade integral como a sua não é somente política: é cultural e pode ser vista de diversos ângulos. É o observador que elege, de acordo com suas opiniões e sua época, alguma ou algumas dessas facetas ou investiga sobre outras ainda desconhecidas.

Ainda se fosse somente o aspecto político, sua permanência espiritual tem sido vista de diversas maneiras, segundo a época, os personagens e os interesses em jogo. É conhecido que apenas há quatro meses de sua morte, em abril de 1930, regressou ao Peru Eudocio Ravínes, importante colaborador do Amauta a quem Mariátegui chamava em sua correspondência pessoal “nosso querido Eudocio”, como enviado do Secretariado Latino-Americano da Internacional Comunista; e em 1933, esse mesmo “querido Eudocio” promoveu “a desmaterialização do partido” [1]. Ou seja, o total abandono das originais teses de Mariátegui sobre o campesinato, a comunidade indígena e a atuação do Partido como célula organizadora das massas à maneira gramsciana. Em 1941, o mesmo ano em que a Alemanha invade a União Soviética, V.M. Miroshevski o classificava como um autor populista e romântico. Em 1942, após ter expulsado Ravínes do Partido Comunista, Jorge del Prado afirmava, em resposta à Miroshevski que, na realidade, Mariátegui havia sido um revolucionário “marxista-leninista-stalinista”, um ortodoxo do marxismo à maneira soviética da época [2]. Em 1945, durante a fracassada primavera democrática do governo de José Luís Bustamante y Rivero, já era introduzido na opinião pública como o fundador do socialismo peruano, através da publicação da segunda edição dos Siete Ensayos por sua família, o clássico livro de Ricardo Martínez de la Torre, Apuntes por una historia marxista del Perú e as biografias de María Wiese e Armando Bazán. Um firme trabalho da família Mariátegui se ocupou de republicar, de maneira contínua, os Siete Ensayos e difundir sua obra em edições populares. Em 1980, ao terminar a revolução militar de 1968-1975, era redescoberto nos trabalhos de José Aricó e Carlos Franco como um marxista “original e criativo”, integrante do movimento internacional entre 1919 e 1929 (antes de sua ruptura com Haya), soreliano e gramsciano [3].

Na realidade, a vigência de Mariátegui tem seu fundamento em como os atores de cada época o reinventam. Em seu prólogo à edição realizada pela Universidad Católica, em homenagem ao centenário ao nascimento de José Carlos Mariátegui, Gonzalo Portocarrero disse “que cada época relê os clássicos a partir de suas inquietudes e esperanças”. E, segundo Portocarrero, “a obra de Mariátegui conserva uma atualidade que a converte em clássica... é um clássico... Nos anos 70, tivemos o Mariátegui classista... nos anos 80, o Mariátegui da agonia... o intelectual... que quis articular o socialismo com a tradição nacional... É certo que nos próximos anos surgirá... uma interpretação de sua obra o­nde se acentuem outros traços, outras facetas de sua rica e múltipla criação [4].

Estamos nesses próximos anos que anunciava Portocarrero e vale que nos perguntemos que Mariátegui é o que necessitamos nesta hora de globalização, anomia generalizada, crise capitalista mundial, crise da civilização, insurgência de novos atores sociais, extinção do proletariado industrial, emergência de potências jovens no cenário mundial, novos caminhos abertos na América Latina. Não nos perguntamos se Mariátegui está vigente ou não, mas sim porque está vigente Mariátegui.

Minha opinião é que a resposta será encontrada somente em Mariátegui, não em seu tempo, mas nos autores que puseram atenção nos problemas do socialismo que nasciam naquela época e se agigantariam depois. E para ele, nos moveremos entre a ortodoxia e a heresia. Para isso necessitamos abandonar toda a posição reverencial. Neste trabalho, trataremos de situar Mariátegui dentro da esquerda de seu tempo, recordando o que dizia e o que fazia enquanto estava na Itália, publicava a Amauta e escrevia os Siete Ensayos. Faremos uma resenha de Friedrich Nietzsche, Eduard Bernstein, György Lukács, Ernst Bloch, Georges Sorel e Rosa Luxemburgo para sugerir que algumas ideias principais destes autores que, provavelmente, foram úteis à Mariátegui, inspiraram seus escritos e, por isso, convém recordá-las hoje, pois foram premonitórias do que depois aconteceu com os experimentos socialistas.

Friedrich Nietzsche

Disse Mariátegui em seu Prefácio aos Siete Ensayos sua famosas palavras:

Meu trabalho se desenvolve segundo o querer de Nietzsche, que não amava o autor contraído à produção intencional, deliberada, de um livro, mas sim àquele cujos pensamento formavam um livro espontânea e inadvertidamente. Muitos projetos de livro visitam minha insônia, porém sei por antecipação que somente realizarei os que um imperioso mandato vital me ordene. Meu pensamento e minha vida constituem uma única coisa, um único processo. E se algum mérito espero e reclamo que me seja reconhecido é o de – também conforme um princípio de Nietzsche – meter todo meu sangue em minhas ideias.

Os princípios de Nietzsche. Quem era Nietzsche?

Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844 1900).

Nietzsche denunciou o nihilismo, a ausência de valores e de rigor vital na sociedade moderna. Estava em crise a visão religiosa do mundo, se estava firmando uma individualidade egoísta, carente de transcendência, se abria espaço para a mediocridade, a igualdade, a mediania. Proclamou que o deus cristão, procedente da tradição judia, estava morto. Era necessário construir novos valores que substituíssem os da submissão cristã, característicos dos escravos. Será um homem novo, que ele chama de super-homem, que ocupará o lugar de Deus. É sabido que o pensamento de Nietzsche teve enorme influência na esquerda europeia, em pensadores latino-americanos como José Ingenieros e, depois, foi utilizado de forma errônea pelos nazistas.

Eduard Bernstein

Eduard Bernstein, social-democrata alemão. Seu nome era impronunciável nos meios da esquerda radical da época. Repudiado como revisionista, companheiro daquele que Lenin chamou “o renegado Kautsky”. Perseguido, imigrou para a Suíça, o­nde editou a revista Sozial Demokrat. Expulso de lá em 1989, teve que refugiar-se em Londres até 1900. Deputado no Reichstag em 1902-1906, 1912-1918, 1920-1928, o típico parlamentar socialista da República de Weimar [5].

Bernstein foi atacado por sua insistência em assegurar que a revolução poderia se realizar de maneira gradual e pacífica. O que acontecia era que observava seu meio. Em Las premisas del socialismo y las tareas de la socialdemocracia (1899), deu conta de alguns sintomas que se converteriam em fenômenos sociais depois, repercutindo negativamente sobre as possibilidades revolucionárias. Os trabalhadores já viviam melhor, o capitalismo estava mais forte, não estava em extinção como afirmavam os marxistas radicais, havia legislação social que amenizava a luta de classes e convertia em desfavoráveis as condições objetivas e subjetivas da revolução socialista. A burguesia de sua época já não era aquele setor homogêneo, criticados por Marx e Engels em seu tempo. Estava mais fragmentada na grande burguesia, pequena burguesia e novas classes médias, uma gama de meios tons na contradição de classes. Alguns setores da classe trabalhadora começavam a viver como a classe média. Bernstein defendia que se devia esperar, porque o socialismo não pode ser construído em meio às privações e à pobreza, e nem no subdesenvolvimento das forças produtivas, senão como resultado do êxito econômico e o desenvolvimento do capitalismo. Acreditava também, como Rosa Luxemburgo, que os partidos socialistas deviam ser o partido do proletariado, porém não a ditadura do proletariado, mas colocando o tema da democracia no centro do debate. Seu grande conceito é o da democracia, a eliminação de privilégios de classe e a igualdade para os indivíduos.

Junto com Lasalle, Bernstein é precursor no apontamento do papel que pode desempenhar o Estado. Segundo ele, era possível avançar mediante a nacionalização ou municipalização seletiva dos meios de produção, tolerando algumas empresas privadas. O Estado devia intervir cada vez mais, porém defendia que, a respeito de muitas empresas privadas, “uma boa lei industrial pode ser melhor que 100 nacionalizações”.

Rosa Luxemburgo [6]

Mulher, polaca, judia e imigrante. Tudo o que podia ser desfavorável na Alemanha do pós-guerra. Isso era Rosa Luxemburgo. Além disso, era apaixonada e não escondia suas opiniões. Na Revolução Russa, criticou os bolcheviques e avisou, à tempo, sem ser escutada, do perigo de que se desenvolvesse uma ditadura, caso fosse seguida a linha bolchevique que confundia a ditadura do proletariado com a ditadura do partido. Reivindicou sempre o caráter profundamente democrático do socialismo. É famosa sua frase: “Freiheit ist immer die Freiheit des Andersdenkenden” (A liberdade sempre foi e é a liberdade para aqueles que pensam diferente).

O tema central de seu pensamento foi o jogo dialético entre espontaneidade e organização, no qual deve considerar-se a espontaneidade como uma aproximação radical, e a organização como uma aproximação mais burocrática ou institucional à luta de classes. A espontaneidade e a organização não são senão diferentes momentos do mesmo processo. Um não pode existir sem o outro. Graças a esta perspectiva, demonstra como a luta de classe se desenvolve até um nível superior. A espontaneidade está sempre mediatizada pela organização. É o jogo entre o revolucionário e o conservador, entre o impulso infantil ou juvenil e a maturidade que dá a experiência.

Ela desenvolveu a Dialéctica de la Espontaneidad y la Organización sob a influência de uma o­nda de greves massivas na Europa, especialmente durante a Revolução Russa de 1905. Não esteve de acordo com a insurreição espartaquista de 1919 e, não obstante, apareceu assassinada junto com Karl Liebknecht como consequência dela.

O dever do partido, dizia Rosa Luxemburgo, consiste em educar as massas não desenvolvidas para levá-las a sua independência, fazê-las capazes de tomar o poder por elas mesmas. O que o partido deve assumir é a educação no elemento subjetivo da Revolução, que consiste em inculcar a consciência de sua missão histórica na classe trabalhadora. A revolução mesma só pode ser levada a cabo pela classe trabalhadora enquanto tal. Um partido que fale pelos trabalhadores, que os represente – por exemplo, no Parlamento – e que pretenda atuar em seu nome, se enlameará e se converterá ele mesmo num instrumento contra-revolucionário [3].

György Lukács (1885-1971)

Bernstein pertence a uma geração anterior a Mariátegui, a do fim do século XIX. Ao assumir posições socialistas, José Carlos já encontrou o debate entre radicais e social-democratas. Em sua própria geração encontramos György Lukács. Quando Mariátegui morre em 1930, aos 35 anos, György Lukács tinha 45 anos (nasceu em Budapeste, em 1885) e teria uma uma longa vida, cheia de vicissitudes até 1971. Viveu sua juventude na Alemanha, o­nde conheceu Georges Simmel, o sociólogo da cultura e vida cotidiana que traduzia para a reflexão sociológica desde os grandes esquemas abstratos até os pequenos problemas concretos da vida cotidiana, criando a micro-sociologia; a Ernest Bloch, o filósofo das utopias; Ferdinand Tönnies, estudioso das características e diferenças entre comunidade e sociedade, que defendia que existe relação entre a complexidade da sociedade e o individualismo, quanto mais complexas as sociedade, maior o individualismo; os neo-kantianos Wilhelm Windelband e Max Weber, com quem Lukács fez uma estreita amizade.

Em suas reflexões anticapitalistas, Lukács não entre no viés das estruturas econômicas, que assinala como de caráter vulgar, medíocre e rotineiro do mundo burguês cujo nascimento já havia apontado Bernstein. É um precursor da crítica à civilização do consumo que depois fizeram Herbert Marcuse em El hombre unidimensional e Pierre Bordieu em La distinción. Frente ao determinismo econômico que era alentado pelo socialismo oficial da social-democracia alemã, enfatiza o papel da consciência, não somente o das condições sociais de vida. A mensagem antecede a de Che: se pode fazer revolução sempre que a consciência das classes oprimidas seja favorável a isso. Porém, frente aos extremistas que querem fazer revolução em qualquer situação, assinala que essa consciência dos oprimidos é importante, ineludível. Destaca o “dever ser” kantiano, que ressalta a ética e não aceita as transações oportunistas com a realidade da política cotidiana. A sua é uma revolta anticapitalista, baseada na ética que é anteposta à fria estratégia do realismo que aceita tudo o que justifica o uso de qualquer meio para obter um fim oportunista ou revolucionário.

Em 1919, Lukács participa na insurreição dos conselhos de trabalhadores que proclama a República Soviética da Hungria, o­nde é nomeado ministro da Cultura e Educação Popular. Pr trás da derrota da revolução, é condenado à morte pelo ditador contra-almirante Miklós Horthy; foge para Viena, o­nde viverá de1919 até 1929. entre 1919 e 1923, enquanto Mariátegui permaneceu na Itália, Lukács escreveu Historia y conciencia de clase.

Segundo Historia y conciencia de clase, toda a concepção marxista da história está resumida e sintetizada na teoria do fetichismo da mercadoria que Marx expõe em O Capital. Não há que ver no capitalismo somente um regime de exploração dos trabalhadores a partir da mais-valia. Mais que isso, o capitalismo é a ordem econômica que converte um todo – seres humanos inclusive – em coisas. Ser revolucionário é, frente a essa coisificação generalizada, reivindicar o valor do humano. E o humano vale não só pelo material e racional, mas também pelo espiritual e espontâneo.

Na época de Lukács, enquanto o então marxismo ortodoxo de Karl Kautsky entendia o marxismo como uma teoria de “leis objetivas” da sociedade, o revisionismo de Edward Bernstein se limitava a defender o socialismo como uma ética.

Lukács defendia que o pensamento racionalista herdado da Revolução Francesa (desde Kant e o positivismo, até Kelsen e Weber) divide mecanicamente a objetividade o­nde se encontrariam as leis da economia e o mercado, separando-a da subjetividade o­nde estão a consciência revolucionária e a ética comunista e estabelece uma fronteira entre ambos campos. Ao fazê-lo divorciam, separam e cindem o objeto e o sujeito, objetividade e subjetividade.

Quando Lukács escreve, em 1922, La cosificación y la conciencia del proletariado, Mariátegui estava retornando ao Peru. O Exército Vermelho dos Trabalhadores e Camponeses havia sido derrotado em Pyotr, Polônia, e Mussolini marchava sobre Roma. A Segunda Internacional se reconstituía em meio à catástrofe financeira da República de Weimar. A hiperinflação e a pobreza castigavam a Alemanha. Se aplicava a Nova Política Econômica na Rússia.

No ano seguinte da publicação de Historia y conciencia de clase, morre Lênin. Imediatamente, Lukács escreve Lenin, la coherencia de su pensamiento e o publica em Viena. Mariátegui já estava no Peru, sofre uma recaída em sua enfermidade e precisa amputar sua perna direita. Prepara a edição de La Escena Contemporánea. Já era uma época de retrocesso, de refluxo mundial.

Nestas circunstâncias, a tese central de Lukács defende a atualidade da revolução frente a quem pretende postergá-la para um inalcançável, longínquo e difuso dia da manhã.

Para Karl Kautsky, máximo teórico da social-democracia, o marxismo se comporia de leis objetivas. E essas leis mostravam que a revolução era impossível enquanto a economia capitalista não se desenvolvesse. Era preciso esperar.

Para Lukacs isso era positivismo, porque levava em conta somente o objetivo e não o devir da história e a consciência de classe.

Em fins desse ano de 1922, se realiza o IV Congresso da Internacional Comunista. O KOMINTERN chama frente única, porém é preciso entender o que era a “frente única”. Trata-se de um bloco de trabalhadores que evite toda a fusão ou concessão doutrinária. A Rússia Soviética já havia sido invadida pela ortodoxia de um marxismo pretensamente científico. A presidência da Terceira Internacional estava a cargo de Gregory Zinoviev. Ele e Nicolás Bukarin condenaram História e consciência de classe, em 1924. O Pravda publicou a condenação em 25 de julho de 1924. Lênin já estava morto e os debates dentro da URSS começaram a resolverem-se administrativa e burocraticamente. Moscou começava a se transformar no Vaticano dos comunistas que podia autorizar ou condenar posições filosóficas e políticas.

Em resposta à Bukarin e Zinoviev, Lukács escreveu Chvostismus und Dialektic. O manuscrito permaneceu escondido durante muitos anos. Foi descoberto nos antigos arquivos do Instituto Lênin, de Moscou, e foi publicado pela primeira vez em Budapeste, em 1996. Na França, foi traduzido em 2001, como título: Dialectique et spontanéité. Em défense de Histoire et conscience de classe (Dialéctica y espontaneidad. Em defensa de la “Historia y conciencia de clase”). Paris, Les Éditions de la Pasión, 2001. Prefácio de Nicolás Tertulian. Ainda não possui tradução para o castelhano.

Ainda em 1925, Lukács escreveu uma crítica à “Teoria del materialismo historico. Ensayo popular de sociología marxista”, de 1921, escrito por Nicolas Bukarin. Bukarin, presidindo em 1928 o VI Congresso da Internacional Comunista, declarou ao materialismo dialético (DIAMAT) “filosofia oficial” da Internacional. A Terceira Internacional se esquerdiza e declara mundialmente a etapa da luta de classe contra classe. Se luta pelo poder na direção do Partido Comunista da URSS. Lukács escreve Tecnologia e relações sociais. Acusa Bukarin de cair em “um materialismo burguês” e em “um burdo naturalismo”. Antonio Gramsci chegará às mesmas conclusões que Lukács (sem ter lido sua critica) quando opina contra Bukarin em seus Cuadernos de la cárcel.

Em resumo, Lukács postula a reunificação da tática e estratégia, mostrando a necessária continuidade dialética entre as reivindicações pontuais das classes oprimidas e a luta pela transformação global da sociedade, ciência e ética, objeto e sujeito, estrutura e consciência.

Antonio Gramsci (1891 – 1937)

No dia 21 de janeiro de 1921, no Teatro São Marco de Livorno, nasce o Partido Comunista da Itália (PCI), seção italiana da Internacional. No comitê central entram dois “ordinovistas” (redatores do periódico de Gramsci L´Ordine Nuovo): Gramsci e Terracini. Mariátegui estava nesse momento na Itália.

Quando em 12 de fevereiro de 1924, sai de Milão o primeiro número do novo diário comunista L’ Unitá e em primeiro de março a nova série quinzenal L’Ordine Nuovo, Mariátegui já está em Lima.

Gramsci escreve uma carta ao comitê central do partido bolchevique que iniciou uma luta entre as diversas correntes: hoje vocês estão destruindo vossa própria obra e correm o risco de anular a função dirigente que o partido comunista da URSS conquistou […] vossos deveres russos podem e devem ser levados a cabo somente no quadro dos interesses do proletariado internacional Porém, Togliatti, delegado do PCI em Moscou, prefere não entregar a carta.

O 8 de novembro de 1926, em violação da imunidade parlamentar, Gramsci é arrastado de sua própria casa e preso no cárcere de Regina Coeli. O ministério público, em conclusão de sua requisição declara que por vinte anos devemos impedir este cérebro de funcionar e, de fato, Gramsci, em 4 de junho, é condenado à vinte anos, quatro meses e cinco dias de reclusão; em 19 de julho é internado na prisão de Turi, na província de Bari.

Em 8 de fevereiro de 1929, enquanto Mariátegui rompe com Haya de la Torre, Gramsci obtém, finalmente, o necessário para escrever e inicia a escrita de seus Quaderni del carcere [7].

Nesses escritos, defende que o poder não se concentra num Palácio de Inverno que tenha que ser tomado, mas que se estabelece num Estado-governo que difunde e impregna a sociedade. É a busca do auto-governo dos trabalhadores, como uma nova forma do exercício do poder. Esta nova forma constitui o embrião e o projeto da sociedade futura que se desenvolve na sociedade presente. A organização partidária não se apresenta como instrumento de recrutamento e seleção ou como tarefa de especialistas que dirigem as massas, mas sim como uma organização através da qual os trabalhadores colocam em pé sua própria organização. Reavalia o papel do Partido e dos sindicatos neste sentido e constrói o conceito de “bloco nacional-popular”, de alianças dirigidas para estabelecer, necessariamente, as novas formas de hegemonia.

À que princípio aponta o intelectual orgânico, segundo Gramsci? A buscar a relação entre a organização e as massas como uma relação entre educadores e educados que se inverte dinâmica e constantemente. O partido é educador das massas e não seguidor das reivindicações imediatas das massas (reformismo) nem deve distanciar-se das massas por seu radicalismo (maximalismo). Deve ser um partido do proletariado, não para o proletariado.

Para Gramsci, o Estado não se reduz somente aos seus aspectos coercitivos (como na concepção de Stálin), mas que compreende o conjunto de processos que se desenvolvem na sociedade civil, as forças espontâneas e criadoras que nascem na prática social do povo, dos trabalhadores. Nas sociedades ocidentais, a mudança revolucionária só pode dar-se quando se luta pela hegemonia social e cultural. Essa hegemonia se desenvolve quando as classes oprimidas elaboram sua própria concepção de mundo e obtém para ela o “consenso ativo” de outras classes e estamentos sociais. Em síntese, a revolução se prepara e sobrevive como mudança estrutural quando os trabalhadores organizados transcendem o gueto sindical e se transformam em classe nacional, assumindo a nação em seu conjunto, sob sua hegemonia e direção política.

O elemento popular sente, porém nem sempre compreende ou sabe; o elemento intelectual sabe, porém nem sempre compreende e, especialmente, nem sempre sente.

Ernst Bloch (1885 – 1977): o conceito de utopia

Ernst Bloch era dez anos mais jovem que Mariátegui. É o filósofo das utopias concretas, das esperanças. Se centra no processo pelo qual o ser humanos se concebe em si mesmo. A consciência do ser humano está dotada de um “excedente” que acha sua expressão nas utopias sociais, econômicas e religiosas, na arte gráfica, na música. Como marxista, Bloch vê no socialismo e no comunismo os instrumentos para trasladar este “excedente” intangível à realidade [8].

Para Bloch, a utopia é algo aberto porque existem muitas coisas coisas não concluídas no mundo, que ainda não se realizaram e que se pode realizar. Criá-las é uma função do ser humano. Esta função utópica é transcendente. Nesse processo de construção, o ser humano se encontra na na esperança e no pressentimento objetivo do que, todavia, não-chegou-a-ser, no sentido do que, todavia, não-chegou-a-ser-o-que-deveria. A função utópica é a atividade inteligida do pressentimento da esperança O conteúdo do ato da esperança é, quando clareado conscientemente, a função utópica positiva; O humanismo se acrescente na utopia e a partir de Marx quando, para Bloch, adquire o verdadeiro sentido: homo homini, uma naturalização do homem, uma humanização da natureza. O caminho da utopia à ciência que teria lugar com a obra de Marx não significa em absoluto que o marxismo deva perder seu impulso utópico, a “vontade de utopia” que lhe abre a possibilidade de pôr ao descoberto as insuficiências do presente.

Georges Eugène Sorel (1847 - 1922)

Como Proudhon, via o socialismo como uma questão principalmente moral. Também estava fortemente influenciado por Henri Bergson, o filósofo da espontaneidade e do movimento. Defendia que o ser humano só vive plenamente em e através de suas obras. Quando busca outras coisas, como o poder, é porque se degenerou de sua verdadeira humanidade. A democracia parlamentar é hipócrita e fraudulenta, vive nas costas dos trabalhadores explorados.

Só é possível resgatar os seres humanos mediante uma força moral, mediante o desenvolvimento de homens novos que não se deixem obcecar pelo temor e nem pela cobiça. Esta ideia do homem novo em Sorel é também a que encontramos em Las fuerzas morales, de José Inginieros e em Educación e lucha de clases, de Aníbal Ponce. Foi a ideia que impregnou a revolução universitária de Córdova, em 1919.

Sorel assinala que não é a possessão de ideias engendradas pelo raciocínio que cria vínculos verdadeiramente humanos, mas sim a vida em comum, o esforço comunitário. A verdadeira base de toda associação é a família, a tribo, a polis em que a cooperação é instintiva e espontânea, e não depende de normas e contratos inventados. As associações que tem por objeto o lucro ou a utilidade, que se fundamentam em um acordo artificial, como é o caso evidente das associações políticas e econômicas do sistema capitalista, acabam com o sentido de uma humanidade comum e destroem a dignidade humana ao gerar um espírito de oportunismo competitivo.

Só o conflito purifica e fortalece, porque cria unidade e solidariedade duradouras, enquanto os partidos políticos são estruturas instáveis, expostas à coalizões e alianças oportunistas. Esse é o vício da democracia.

Através de mitos é como o socialismo pode converter-se em uma espécie de poesia social, algo oposto ais seus representantes corrompidos ou covardes.

Em resumo, defendemos que Mariátegui viveu um ambiente intelectual revolucionário, oposto ao cientificismo, à apologia e ao dogma. Assombrosamente bem informado para seu tempo, aberto a todas as ideias; Recordamos que em sua época e antes de sua época, se fizeram muitas formulações que foram depois esquecidas em nome do mesmo cientificismo marxista que pretendia, em palavras de Lukács, “coisificar” o marxismo. Muitas advertências sobre as consequências de uma aplicação dogmática do marxismo, feitas por autores anteriores e da época de Mariátegui, que destacamos neste texto, foram desprezadas e esquecidas. Por isso revisitamos essas opiniões. Porque acreditamos que são valiosas e devemos tê-las em conta para nossas tarefas do presente.

E então, podemos responder a pergunta apresentada no começo deste trabalho: que Mariátegui necessitamos hoje em dia? Quem é nosso Mariátegui? Me permito opinar que a resposta é: o Mariátegui total, o que se movia com comodidade nas ideias de Sorel e Nietzsche, ao invés de doutrinário na Defesa do Marxismo. Porque Mariátegui demonstrou que a ortodocia não é necessariamente oposta à cultura e nem às ideias novas que vão nutrindo a existência humana. Mariátegui foi um revolucionário marxista, não foi nem social-democrata à moda de Kautsky, nem “aprista” à moda de Haya, nem extremista à maneira do infantilismo revolucionário alemão de 19, nem leninista à maneira da Terceira Internacional de Bukarin. Nem europeísta. Foi uma árvore com raízes na realidade peruana e indo-americana, com ramos e folhas hoje expandidas pelo mundo. Essa e a sombra que todavia cobiçamos. Não esquecemos a lição.

Tradução: Maria Fernanda M. Scelza

NOTAS

[1] “O mariateguismo é uma confusão de ideias procedente das mais diversas fontes. Não há quase tendência que não esteja representada nele. Antes de ter bebido na fonte do marxismo, e particularmente no leninismo, Mariátegui conheceu o movimento revolucionário através das mais diversas tendências proletárias. Teve grandes equívocos não só teóricos, mas também práticos. São na realidade muito poucos os pontos de contato entre o leninismo e o mariateguismo e estes contatos são mais bem incidentais... nossa posição frente ao mariateguismo é: tem que ser de combate implacável e irreconciliável, posto que é entrada para bolchevização orgânica e ideológica de nossas fileiras, impede que o proletariado se arme dos arsenais do leninismo e do marxismo, obstaculiza o crescimento rápido do PC e a formação de seus quadros; é uma das dificuldades muito sérias para colocarmos no topo dos grandes acontecimentos e cumprir assim nosso papel de vanguarda dos explorados em suas lutas e ações. (Fragmento de um documento do Partido Comunista da época de “classe contra classe” citado por Héctor Béjar em: APRA – PC 1930 – 1940, itinerario de un conflicto. En: “Socialismo y Participación”. Nº 9, fevereiro 1980, p.13).

[2] Em um artigo escrito em 1941, V.M. Miroshevsi, conselheiro do Bureau Latino-americano do Komintern, assinalou o “populismo” e “romantismo” de Mariátegui baseando-se nas esperanças deste no passo da comunidade indígena ao socialismo, à maneira dos populistas russos. (V.M. Miroshevsi. El populismo en el Perú. Papel de Mariátegui en la historia del pensamiento social latinoamericano. Publicado originalmente em Moscou e reproduzido em Dialéctica, revista do Partido Comunista Cubano, nº1, Havana, Cuba – maio-junho de 1942).

[3] Tratarei de mostrar, disse Aricó, que M

Osmar Gomes da Silva en Kaos en la Red

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